Ouça Duas Vezes: Quando a Música Ganha um Novo Significado
- Leticia Carmo Lopes
- 10 de mar.
- 4 min de leitura
Atualizado: 13 de mar.
🚨 Esse texto contém spoilers sobre o filme "Pisque Duas Vezes". 🚨
Sabe quando você ouve uma música pela primeira vez e ela simplesmente passa batido? Mas, em um outro momento, dentro de um contexto diferente—um filme, uma festa, um evento marcante—ela ganha um novo significado e de repente se torna especial? Esse fenômeno é mais comum do que imaginamos e acontece porque a música, assim como qualquer forma de arte, se transforma conforme as experiências que vivemos.

Sou uma pessoa que sempre amou música, arte, leituras e pesquisas. E recentemente, tive uma experiência dessas com um álbum que já estava no mundo há algum tempo, mas que só agora me impactou de verdade:
Renaissance, da Beyoncé, lançado em 29 de julho de 2022.
Só em março de 2025 percebi o quão incrível ele é. O que mudou?
O contexto em que ouvi!
Estava assistindo ao filme Pisque Duas Vezes, dirigido por Zoë Kravitz, e lá estava I’M THAT GIRL, da Beyoncé, tocando em uma cena carregada de significado (deixo um pedaço da letra abaixo).
I’M THAT GIRL: "Eu chego com essas roupas, linda demaisI pull up in these clothes, look so good Brilhando até o fim, fazendo dinheiro, bem verde Pimping till the end, make that cheese, nitty green Me faça o favor, filhos da puta não vão me parar Bitch please, motherfuckers ain't stopping me Porque eu sou fodona 'Cause I'm in that hoe Brincando com esses caras como se eles fossem brinquedos, eu não vou Playing all these boys like toys, I ain't going Você sabe, todas essas músicas são boas demais You know, all these songs sound good Nunca vou ser fácil, tá vendo esses caras agindo como se eles fossem fodas Never hoeing, see they niggas acting like they pimps Tentando me impressionar, eles não tem um centavo Try to pimp me, niggas get broke for the end Agora eu tenho que ir porque tô cansada dessa merda Now I gotta go 'cause I'm out this bitch" |
A escolha dessa música não foi aleatória: a trilha sonora do filme foi cuidadosamente selecionada para refletir os dilemas da protagonista, Frida, que no início da história se sente completamente perdida no que quer da vida.
Em suas próprias palavras, ela diz: "I guess I just, you know, dont'know what the fuck I'm doing" ("Eu acho, sabe, não sei que P* eu estou fazendo").
Desde o início, percebemos que ela está em busca de seu lugar ao sol, e sua ambição é traduzida na frase: "O sucesso é a maior vingança".
A diretora Zoë Kravitz declarou que esse é um filme sobre poder—e, de fato, o enredo gira em torno de como ele pode moldar e corromper as pessoas. Frida tem ambição, mas a grande questão é: como ela o conseguirá e até onde está disposta a ir para isso?
O filme também nos apresenta o personagem Slater King, um homem rico e carismático que esconde sua verdadeira natureza por trás do status e da influência.
Ele representa o abuso do poder, utilizando sua posição para manipular e explorar.
Ao longo da história, Frida vivencia essa dinâmica e, no final, torna-se uma versão distorcida do que um dia combateu—um exemplo clássico do oprimido que se torna opressor. Mas a grande pergunta que o filme deixa no ar é: valeu a pena?

Frida começa sua trajetória servindo champanhe em festas de luxo, e termina sendo servida.
Superficialmente, parece um final feliz—ela conseguiu o que queria. Mas a que custo?
Será que a vitória é realmente uma vitória quando a jornada é marcada por concessões morais e perdas irreparáveis? Essa é a força da arte: provocar, questionar e nos fazer refletir sobre as nuances da vida real, onde nada é preto no branco.
O filme sugere que, no fim, tudo depende da nossa perspectiva e das escolhas que fazemos. Poder, sucesso e felicidade são conceitos subjetivos—e cada um precisa decidir o que realmente vale a pena.

A trilha sonora do filme foi cuidadosamente escolhida para refletir esses momentos, como a icônica The Boss ( que fala sobre pagar o preço para ser o chefe), de James Brown, que toca no início do longa, estabelecendo de cara o tom da narrativa.
O mais interessante nessa busca pela batida perfeita é que a própria Zoë Kravitz revelou que não achava que conseguiria a autorização para incluir a música da Beyoncé no filme.
Veja a entrevista abaixo onde ela afirma isso:
Como o orçamento para a trilha sonora era limitado, sua equipe fez o pedido sem grandes expectativas.
Mas, para sua surpresa, Beyoncé assistiu a um clipe da cena e aprovou a inclusão da faixa.

Para quem ainda não assistiu e passou por essa experiência, o filme Pisque Duas Vezes está disponível no Prime Video.
Isso me fez refletir sobre como as artes se conectam. Muitas vezes, um filme nos leva a um livro, uma música nos leva a um filme, e assim por diante
Foi assim com Twin Peaks: vi o filme e corri para ler o livro. Twin Peaks despertou minha curiosidade para o universo criado por David Lynch.

2001: Uma Odisseia no Espaço fez com que eu buscasse sua versão literária para compreender ainda mais a história.

Essa troca entre obras e espectadores é o que mantém a arte viva, nos inspirando a criar novas interpretações e narrativas!
E você? Já teve esse momento de "descoberta tardia", quando algo que sempre esteve ali finalmente fez sentido?
Se ainda não, experimente revisitar um álbum, um livro ou um filme com um novo olhar.
E se quiser uma sugestão para começar, ouça Renaissance, da Beyoncé. Você pode se surpreender.
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